domingo, 24 de fevereiro de 2008

Jornal Peregrinos (Japão-Brasil 100 anos)

Nossa família peregrina (2)
Joji e Mitsuko Nohara, em busca de um sonho

Joji e Mitsuko Nohara eram meus avós por parte de pai. Joji, meu avô, era da província de Hiroshima. Sua família tinha uma loja onde vendiam "gueta" (sandália japonesa). Aos 16 anos de idade embarcou para o Brasil com toda família. Eles moravam bem próximo de onde caiu a bomba atômica que atingiu a cidade de Hiroshima. Se não tivessem imigrado para o Brasil, com certeza teriam sido atingidos pela bomba. Minha avó, Mitsuko, morava na província de Kumamoto. Sua família trabalhava com agricultura, e aos 12 anos de idade imigraram para o Brasil. Lá, mais tarde, eles se conheceram, pois ambas famílias moravam em Tomeaçú interior do estado do Pará, onde trabalhavam com agricultura. A comunidade nipônica ali era muito grande na época.

Os filhos só aprenderam o Português quando freqüentaram escolas brasileiras, pois dentro de casa só se falava japonês. Mas meu avô aprendeu com certa facilidade o português, pois havia morado até os 12 anos de idade no Havaí, onde aprendera a falar inglês também. Já a minha avó, sempre falou português com certa dificuldade. Casaram-se e continuaram morando lá até criar todos os filhos.
Mais tarde se mudaram para a cidade de 3 de outubro, também interior do estado do Pará, mas logo depois se fixaram na cidade de Castanhal, que fica a, aproximadamente, 65km da capital Belém, onde tinham uma barraquinha na feira da cidade. Meus avós sempre gostaram de mexer com a terra e passaram para todos os filhos essa paixão.
Eles tiveram uma vida difícil no começo, como a maioria dos imigrantes japoneses. Meu avô chegou a ser preso como outros homens da comunidade quando o Japão perdeu a guerra. Tiveram suas casas queimadas e só as mulheres ficaram para poder reerguer tudo e esperar seus maridos e filhos voltarem. Lembro-me do meu pai contando que sua avó havia escondido o dinheiro que tinham em uma lata e enterrado no quintal da casa. E foi com esse dinheiro que as mulheres conseguiram se manter de certa forma até os maridos e filhos retornarem. Apesar de todos esses altos e baixos, meus avós eram pessoas muito alegres, e extremamente carinhosos com os netos. Sempre nos passaram os costumes japoneses através de musicas de roda e brincadeiras típicas do Japão. Meu avô era também um craque em Guetobouru (um jogo japonês, um tipo de golfe modificado). Lembro de ter brincado muito com ele e com meus primos na nossa infância.

Minha avó era uma mulher guerreira, um exemplo de mulher. Lembro quando ela me falou para correr atrás da própria felicidade pois ela não vem até nós se não a buscarmos. Ela dizia que ela e meu avó só conseguiram ficar casados por 50 anos porque tinham casado por amor, coisa rara na época, onde muitos se casavam por omiai.

A maior alegria deles foi quando os filhos os trouxeram para passear aqui no Japão, quando cada um retornou à sua terra natal. Minha avó ainda conseguiu reencontrar a prima que não via há mais de 50 anos.

Meus avós foram exemplo de superação e perseverança em busca de um sonho. Foram pessoas que imigraram para uma terra distante sem falar o idioma e sem, sequer, conhecer algo da cultura local. Por isso, tento me espelhar no exemplo que eles deram toda vez que me deparo com uma dificuldade aqui no Japão.

Kiara Castro
Comunidade de Tsuchiura


(artigo retirado do Jornal Peregrinos da edição de fevereiro de 2008)

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Mapa de acesso - Igreja Católica de Tsuchiura

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